segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

Política: desrespeito e impunidade

Assédio moral e sexual, preconceito e desrespeito fazem parte da rotina das empregadas, diz pesquisa.É na internet,sob proteção do anonimato ou de identidades falsas,que o preconceito contra empregadas domésticas se se manifesta de forma mais aberta.Nas quase 700 comunidades dedicadas a elas no site de relacionamento Orkut ,- www.orkut.com - internautas contam,em tom de piada, as situações de xingamento,de acusações mentirosas de roubo e assédio sexual das quais suas empregadas já foram vítimas.Histórias como essas fazem parte da realidade compartilhada pela maioria das domésticas brasileiras,especialmente as de etnia negra com idade entre 13 a 63 anos, - Imaginem: Essas pessoas desrespeitam aquelas que poderiam ser suas filhas,quem sabe,até suas avós? - Por coincidencia ,todas já tinham trabalhado como doméstica ou eram filhas de empregadas,o que analisou a antropóloga Dora Porto, que estudou mais de 100 variáveis ligadas à qualidade de vida destas mulheres.O estudo mostrou que,de forma geral,essas trabalhadoras assumem muito cedo a responsabilidade de casa e temem o desemprego.Por isso,muitas aceitam ofensas verbais e os vínculos empregatícios precários.Esse é o caso da doméstica Vera Lúcia Barros,30 anos,que nunca trabalhou com carteira assinada em dez anos de profissão."Meus contatos sempre foram de boca.Quem está precisando,não pensa nesses detalhes",revela.SILÊNCIO: - Por medo da demissão,elas também optam por não entregar aos patrões atestados médicos e mantêm seus afazeres mesmo doentes;aceitam o ritmo pesado do trabalho,muitas vezes com uma carga superior a 12 horas diárias e evitam tirar férias."Esses problemas existem aos montes,mas ficam no silêncio porque muitas empregadas têm medo de procurar a justiça",confirma o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Domésticos do Distrito Federal,Antônio Barros.Para a antropóloga,é curioso que a maioria das patroas negue a existência deste tipo de relação com as empregadas."Quando contava o resultado da pesquisa para conhecidos meus e a tendência natural era ouvir a defesa dos patrões",lembra Dora.As histórias falavam de roubos cometidos por empregadas e de amizades surgidas entre elas e as patroas,situações também comum.No entanto,ela acredita que esses atos não podem ser usados como desculpa para ignorar os abusos."E preciso deixar a hipocrisia de lado,dar visibilidade para a situação e estimular a criação de políticas públicas voltadas para as mulheres",defende a especialista.Dora também chama atenção para um problema comum no passado,mas anda existente em algumas casas brasileiras:trabalho doméstico infantil.Uma das idosas entrevistadas na pesquisa foi levada para trabalhar numa casa de família.Ela foi responsável por todo serviço doméstico:cuidar de três crianças, cozinhar,lavar roupa e até mesmo passá-las,o que,naquela época,implicava no uso de ferro a carvão.
Números:
* Existem aproximadamente 8 milhões de empregados domésticos no Brasil,o que corresponde a toda população de Pernambuco.
* 95% deles são mulheres.
* 82% das mulheres são negras.
* Quase 500 mil crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos estão no trabalho doméstico.
* Essa classe de trabalhadores recebe apenas 35% da renda média de todos os trabalhadores.
* 27,5% não chegam a receber um salário mínimo por mês.
* Apenas 26% têm carteira assinada.
* Menos de 2% deles são sindicalizados.
* O trabalho dos empregados domésticos é regularizado desde 1972,com a publicação da Lei Nº 5.859.
* O Brasil foi condenado uma vez por discriminação racial pela Organização dos Estados Americanos (OEA) porque não investigou o caso da doméstica Simone Diniz, que foi impedida de participar de uma seleção de emprego por ser negra."Não trabalho mais em casa de família"As experiências negativas da vida de Silmara Alves de Souza,35 anos,a fizeram desistir do trabalho doméstico.Hoje,como recepcionista,ela até admite ganhar menos que uma babá.Mas,para "casa de família",ela não volta.Uma de suas ex-patroas não a deixava pegar o filho pequeno.O motivo era simples:a empregada usava hospital público e poderia passar alguma infecção para o bebê.Em outra casa,Silmara era xingada pelas crianças.A patroa não acreditava que seus filhos fizessem tais grosserias.A doméstica tinha uma jornada de 12 horas,só podia comer a sobra do almoço e era proibida de abrir a geladeira.Depois de oito meses de sofrimento,não pensou duas vezes:Abandonou o emprego.Os direitos da empregada doméstica Por não serem contempladas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),os empregados domésticos não têm direito a feriados,isso acaba sendo negociado a critério dos patrões.Também não lhes são lhes são asseguradas garantias como jornada de trabalho restrita a oito horas diárias;adicional noturno;salário-família,benefício para auxiliar no sustento dos filhos até 14 anos; Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS);e o seguro-desemprego,que existe para proteger o trabalhador em caso de demissões sem justa causa.Mas a lei que ampara os trabalhadores doméstico (Lei nº 5.859) garante salário não inferior ao mínimo,uma folga por semana,preferencialmente aos domingos,férias anuais,adicional de férias,13º salário,licença maternidade,aviso prévio e vale-transporte.Em setembro de 2006,foi sancionado o projeto de Lei relativo à Medida Provisória nº284,que garante aos trabalhadores domésticos 30 dias de férias anuais (antes eram 20).A lei também proíbe os patrões de descontar dos empregados custos de alimentação, uniforme , higiene e moradia e de demitir a doméstica grávida desde a confirmação da gravidez até cinco meses depois do parto.A lei estimula o empregador doméstico a contribuir com Instituto Nacional do Seguro Social (INSS),já que o valor agora pode ser descontado do Imposto de Renda.
UNB - Notícias - ano 10 adaptado por Paula Mattäus.